A year ago #1
Há um ano atrás, parti com a sensação de missão: lutar pelo destino. Nada de coragem, simplesmente em vez de fugir para trás, para variar fugi para a frente. Pior do que o que estava, seria difícil (ou pensava eu).
E, então, enfrentei a barreira do check in como uma passagem a uma outra vida. Sentei-me com uma hora de antecedência, porque a ansiedade era enorme. Olhava à volta, atenta a cada um dos presentes, procurava memorizar os costumes, as expressões. Lembro-me de ter olhado para os jornais do dia e pensar "talvez um dia sinta saudade disto". Enumerei num livrinho perto aquilo que, de certeza, iria sentir falta e não poderia reaver:
...dos jornais, o meu gosto por aquele cheiro a papel (filha de jornalista em part time tem destas coisas) só iria ser convertido pelo acesso clean dos teclados da world wide web;
...dos golos do Porto ao vivo, mas também era verdade que já não ia ao Dragão há muito tempo;
...da Ribeira, de forma alguma uma perda reconversível - aquele lumiar abandonado não há em mais lado algum do mundo;
... da minha faculdade, mais concretamente, do sentimento de estar em casa quando entrava naquele quadrado guardado a jardins inesquecíveis - mas sabia já que dentro de um ano já nada disso restaria (evoluir dos tempos oblige);
...dos sorrisos de quem amava (e amo!) e aquele sentimento de lobo no mundo, sabendo que a minha matilha andava algures por aí e só tinha de uivar para os chamar.
Lembro-me do sorriso com que embrulhei estas faltas. Encolhi os ombros, por causa da missão. Um sorriso, ainda o sinto, mesclado a dores de barriga e a olhos inchados das noites mal dormidas dos últimos 3 meses. Sentei-me no lugar marcado e ainda capturei a memória imagética: 14F. Lembro-me de ter tentado fechar os olhos, sem sucesso. Repetia itenerários, rezando para que a morada estivesse certa. E estava. E bastou ver-te à porta para saber que tinha entrado noutra dimensão. Numa dimensão em que nós, ao contrário do mundo, éramos bem possível. Levo comigo para sempre, como ideal de inquietude pacífica - daquelas que nos embalam pela existência fora - o quanto ansiei por ver-te dormir.
Do que vivi nesse dia, ficaram marcas. Das que ficam, e não saem. Hoje oscilam entre a chaga e a cicatriz, o futuro dirá se a ferida ficará sempre aberta, nem que não seja pelo ponto de comparação. Detestaria olhar para trás e achar que foi só ali que fui só eu. Só eu e tu.
Vivi, e vivemos, a ilusão contemporânea do que seria viver ali. Nós os dois. E eu, sabendo já que não seria possível, deixei alimentar a ideia, porque - digo agora um ano passado - era a única forma de não sentir o vazio de não saber o que fazer comigo, o que fazer contigo, o que fazer connosco.
E, na véspera do morrer da ilusão, tudo voltou à estaca zero. O coração que batia quase explodiu, as mãos gélidas tremeram, hesitaram, tremeram novamente. Eu tremi. A minha vida tremeu. E, passado um ano, continua a tremer.
É, passado um ano , continuo sem saber o que fazer a este vazio que se instalou e, quase chaga, parece não querer parar de se instalar. Mesmo sabendo o que tenho de fazer - o que tenho de fazer para te estancar em mim.
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