Final de processo
Sabes, eu não sei tanto como tu pensas.
Não sou um misto de oráculo e sapiência quotidiana.
Só te pareço uma tábua de salvação, porque é estratégia da minha parte. Construir-te em paralelo ao mundo, para que lá vivas. E como o conseguiste, perguntas-me, agora, como vais viver, sem estares comigo.
Digo-te que é normal que assim sintas (sinónimo de que o meu trabalho foi bem feito), todos os psicoterapeutas de Freud a Jung, passando por Klein e Rogers, acabando no Mahoney e no Guidano, falaram nisso.
"A si não lhe deve custar, já deve estar habituada, não é, Drª?"
Não é rigorasamente assim. Há alguns que custam mais do que outros. Algumas vezes (talvez mais do que gostaria) ainda penso nos casos mais complicados que tive, e mesmo fazendo o follow-up by the book, ainda me pergunto como estarão.
Rapidamente desestruturei a ideia do psicoterapeuta como alguém inócuo, absolutamente neutral, o sorriso estratégico e absolutamente controlado, com fronteiras invioláveis. Nem acho que ser assim é a melhor forma de exercer a profissão...de fé. Podemos ser estratégicos, sem ser exclusivamente estratégia; podemos ser controlados sem ser exclusivamente controlo.
E sim, também eu vou sentir a falta de te ver crescer. Sei relativizar, porque este é o meu estilo de psicoterapia. Fazer parte da vossa vida para, progressivamente, sair de cena.
E hoje saí de cena.
1 Comments:
Muito bem posto.
Por muito que custe é sempre a melhor das alternativas possíveis.
A dependência do terapeuta, ainda que importante ao longo do processo, nunca deverá ser fomentada pelo próprio.
Post a Comment
<< Home